Continuo regando as plantas de meu jardim. Nele existem muitas flores e folhas: gardênias, jasmim, bromélias, girasol, gerbera, lírios, margaridas, rosas e tulipas. Encontro muitas paz com os pés na terra e o ar puro das estações. A chuva que chega, o sol que nasce, a noite que cobre. Tudo nos fala da vida. Ela é uma variação: as estações do ano. Inconstância. Impermanência perpétua. Beleza e galhos secos. Os seres humanos, ocupados demais com suas convenções, esqueceram de olhar para a terra. Querem dominá-la e extrair seus recursos num poderio sem fim. Tudo fala em nome de alguma autoridade, deve-se obedecer e pronto. Narcotização.
Será que algum dia encontrarei um ser humano de verdade. Não aquele disposto a comprar a tranquilidade de sua consciência querendo, num egoísmo estético, se achar no direito de corrigir o mundo e todas as pessoas. Todos estão errados, menos ele, que fala do lugar inatingivel de seu título. Olha com uma desconfiança básica, mas demonstra um falso otimismo. Foge de si, não se conhece e odeia tudo relacionado ao corpo e a terra. Ele quer dos céus outro mundo pra viver. Perde-se a beleza, inventa-se risos e alegrias construídas por sonhos e certezas.
Um dia sairei de noite cantando ao mundo a canção da vida! Verei pessoas inteiras, verdadeiras. Um olhar que não seja construído pela arrogância de um título ou de um diploma. Que nos olhe sem a contaminação dos preconceitos, sem rótulos, sem água oxigenada, sem diagnósticos, sem títulos, sem rótulos. Com a simplicidade das plantas e das flores do meu jardim. Procuro alguém que me possa oferecer companhia gartuita, generosidade e transparência. Sem discursos ideológicos, prontos e cheios de artefatos intelectuais. Quero um homem-tempestade, que deixe falar sua indignação, que traga a luz a sua experiência! Que traga à luz o que esconde atrás da cortina. Que me olhe e me abrace com uma sorriso sem exigências. Que brinque de si mesmo e que não se leve a sério. Que não olhe tudo com a seriedade de uma prepotência garantida pela segurança ilusória do conforto, da estagnação, da resignação. Alguém que revolucione, que construa novos valores. Que se deixe ser tocados pelas coisas, que se assombre com a complexidade da vida ao invés de tentar explicar e falar de SUA vida. Como diria o poeta: Jamais alguém deveria nos ensinar a viver: pois ele nos ensinará a viver sua própria vida.
Chega! O mundo me espera. Tic-tac... o relógio não para. Mas para quem vive na orla do tempo, na extremidade do mundo, o tempo é mais uma construção distrativa do essencial...